Quando tanto se confunde forma com conteúdo, perdendo-se a capacidade de entender até onde a sede de imediato nos irá privar de mais conhecimento, Sérgio Conceição e Rúben Amorim defrontam-se em territórios onde se expressam, hoje, com total abrangência de funções – exceto na capacidade de dizer não à saída dos seus melhores talentos.

Questões sobre forma e conteúdo
Forma e conteúdo geram enormes equívocos, pela maneira como não é possível separar uma da outra. Enquanto a forma nos parece saltar à vista, elaborando-se a partir de um certo imediatismo no ver e no sentir, o conteúdo tende a transformar-se em efeitos mais demorados, procurando encontrar o momento para se revelar em toda a sua profundidade. É no esforço definidor de forma e conteúdo que nascem os primeiros conflitos ao seu entendimento. Por ser a forma aquilo que é visível do conteúdo, tantas e tantas vezes o observador não consegue passar para lá desse primeiro encontro. E, por consequência, o imediatismo com que lê a forma acaba por fazê-lo considerar que o conteúdo é um elemento dispensável, quando é essencial para aquilo que está a ver.
Entenda-se assim que aquele que se foca excessivamente na forma acaba por perder o fio condutor da sua ação. A forma, por si só, pouco ou nada define e oferece-se a uma ilusão que não tem como perdurar. Para lá do imediato está, sempre, aquilo que o torna perene. E é no futuro que acabamos por depreender da capacidade dos objetos e das decisões para uma avaliação completa dos seus efeitos. A análise dos futuros passados oferece-nos um imenso território onde delinear as nossas previsões. Não estamos propriamente a inventar comportamentos a cada instante, mas sobretudo a repetir coisas que já foram vividas, sentidas, ditas, ouvidas, por muitos e muitas antes de nós. Aqueles que se ficam pela forma tendem a desaparecer rapidamente. Aqueles que se focam nos conteúdos, podem demorar a amadurecer, mas tendem a permanecer por muito mais tempo.
Sérgio e Rúben: elementos complexos na paisagem
A sexta temporada de Sérgio Conceição no FC Porto e a quarta temporada (a primeira delas, incompleta) de Rúben Amorim no Sporting permitem-nos trabalhar aquilo que é forma e aquilo que é conteúdo dos dois treinadores nos respetivos clubes. Ainda que seja na forma que muitas vezes se têm concentrado as análises, ficando apenas por um dos elementos fundamentais do trabalho de treino e liderança de um processo coletivo no futebol profissional. A imagem que ambos os técnicos trazem dos seus tempos de jogador são elementos preponderantes no tratamento da forma. A intensidade do jogador Conceição está sempre a regressar à colação dos elementos, enquanto a tranquilidade do jogador Amorim influencia diretamente a forma de entender as opções deste. De alguma forma, os dois treinadores desenvolvem uma parte da sua presença mediática a partir desses caracteres com que há muito se identificam.
Apesar de tudo nos empurrar para a simplificação, estamos perante dois elementos bastante complexos na sua forma de atuar, ambos envoltos em contextos que se tornaram muito mais abrangentes do que o papel de treinador parece enquadrar. Sérgio Conceição no FC Porto e Rúben Amorim no Sporting transformaram-se em líderes de comunicação, assumindo eles o tratamento em público dos assuntos das respetivas equipas. Esse facto advém do crescimento de influência que ambos têm na decisão, mas também de um certo abandono à personalidade dos seus treinadores de administrações de clubes que não saberiam como comunicar melhor aquilo que vão fazendo. Se, no caso do FC Porto, Sérgio Conceição já teve que lidar várias vezes com a perda de qualidade do seu plantel, tendo dado sinais de enorme capacidade para corresponder e recuperar o nível competitivo dos portistas, Rúben Amorim enfrenta esta temporada o primeiro grande momento de depressão no que toca à qualidade do grupo que lidera.
O conteúdo que salva a forma que não se fixa
Porque em questões de estilo e forma o jogo do seu FC Porto teve bastantes variações desde que assumiu este trabalho, buscando até diferentes princípios conforme a temporada, Sérgio Conceição tem sido considerado um treinador de menor identidade na forma como constrói as suas equipas. O problema, aqui, está numa excessiva concentração na forma. No que toca a conteúdos, as equipas de Sérgio Conceição têm apresentado um crescente aproveitamento dos seus recursos, nunca se permitindo uma excessiva dependência das primeiras linhas do plantel, nunca deixando cair elementos que possam ter margem de progressão, constantemente apostando e clarificando os espaços e os passos que cada jogador terá que percorrer até encontrar o seu lugar. Essa identidade permite, neste início de temporada particularmente nefasto no que toca à manutenção de talento no plantel, vermos um Porto competitivo e capaz, quase como se não tivesse perdido alguns dos seus principais trunfos.
Rúben Amorim foi sempre destacado pela forma de jogar das suas equipas. A novidade do seu esquema, a determinação em mantê-lo perante fosse qual fosse a situação, valeu-lhe uma ideia de identidade que volta a ser fortemente atacada pela realidade da composição do seu plantel. Depois de, mais de uma vez, ter dedicado espaço comunicacional à necessidade de fazer sacrifícios para manter Matheus Nunes no plantel, perder o internacional português obrigará o Sporting a ir jogar ao Dragão sem uma das suas referências da última temporada e sem tempo para encontrar soluções alternativas. É o momento-chave para a demonstração do conteúdo. O facto de dispor de menor profundidade e de procurar, sobretudo, em jogadores muito jovens as respostas para os problemas da equipa, levarão Amorim a expor-se quanto à maneira como tem sido valorizado. O resultado, para já, parece ter perdido espaço de análise para a fragilidade da equipa. Mas é sempre o treinador que é testado quando é preciso encontrar a resposta de uma nova equação.
Fim-de-semana de grandes jogos
O meu calendário abre na hora de almoço de sábado com o Tottenham – Wolverhampton na Eleven Sports, num dia marcado pela realização do FC Porto – Sporting. Domingo, passo pela Antena 1 para acompanhar o Casa Pia – Boavista e regresso à Eleven para acompanhar a Real Sociedad – FC Barcelona.