O alemão Roger Schmidt veio demonstrar que, mais do que pensamento ofensivo, a sua proposta passa pelo entendimento da complexidade do futebol dos nossos dias, algo que Rúben Amorim e Sérgio Conceição também têm trabalhado nas suas equipas. Uma semana fundamental para defender o valor dos treinadores dos três grandes portugueses.

Mudar sem paragens no jogo – o Benfica em Turim
Na antevisão do jogo do Benfica em Turim, João Mário argumentou que a chegada de treinadores estrangeiros implica mudanças ao nível dos comportamentos em treino e jogo. Num país que tanto valoriza a sua escola de treinadores, esta frase mereceria um pequeno tumulto nas verdades adquiridas que muitos adoram repetir, para mais vindo de um jogador que já trabalhou sob as ordens de Jorge Jesus e Rúben Amorim. Mas a exibição do Benfica perante a Juventus acaba a comprovar parte daquilo que João Mário tentou apontar. Após um início atabalhoado, com um erro na defesa de um esquema tático e com alguma dificuldade para encaixar e pressionar a Juventus no meio-campo ofensivo, o Benfica foi capaz de, em jogo, adaptar o seu comportamento defensivo, recuperar bola e acabar a dominar a partida, garantindo uma importantíssima vitória.
A chave não estará tanto na mudança ao nível do comportamento, no entanto, mas ao nível da complexidade do trabalho da equipa de Roger Schmidt, se comparado com os seus antecessores no Benfica. O técnico alemão chega de uma realidade onde as equipas definem a sua identidade na pluralidade de opções perante o jogo, tendo começado pela vertigem de uma transição que procura aproveitar todos os espaços oferecidos pelos rivais e evoluindo, nestas últimas semanas, para uma maior capacidade com bola que lhe permite gerir os tempos do jogo. Essa necessidade de entender os vários momentos do jogo e os vários períodos que este propõe é decisiva para oferecer o tipo de exibição que o Benfica alcançou em Turim. Com boas opções a partir do banco e com o entendimento que defenderia melhor, nos minutos finais, subindo no terreno do jogo do que oferecendo campo ao rival.
O poder da transição – Sporting contra a Premier League
Será, no entanto, injusto de classificar os treinadores pela sua nacionalidade, bem como é bastante incompleto falar do “treinador português” como uma unidade ideológica, quando o que acontece em Portugal, e por várias vezes já referi esta ideia, é uma confluência de escolas e de pensamento estratégico que tem valido aos nossos treinadores a capacidade de criar impacto na forma como pegam nas equipas. Curiosamente, se olharmos para processos mais longos, nem sempre os resultados serão tão bons. Rúben Amorim e Sérgio Conceição têm trabalhado para refutar essa incapacidade. Para o Sporting, de forma algo impressionante, transformando um mau início de temporada e uma atitude fragilizada no mercado numa entrada de leão no contexto europeu.
Rúben Amorim é o grande responsável na forma como transforma os seus jogadores em peças de muito maior valor do que aquele que apresentam à partida. É um autêntico polidor. Matheus Reis será o exemplo mais gritante dessa capacidade, mas a forma como Manuel Ugarte e Pedro Gonçalves passaram a assumir um meio-campo que, sem espaço para dúvidas, aprendeu imenso nas dificuldades da época passada, reflete de maneira clara o tipo de processo que Amorim preconiza no seu discurso desde o início. Perante os Spurs, o Sporting teve o condão de resistir aos momentos de maior domínio do adversário, nunca desistindo de ser muito perigoso na forma como atacava a transição – e Edwards sobressai imenso no desequilíbrio que oferece nesse espaço. O Sporting de Amorim foi, na época do campeonato, uma equipa de posse com ideias de transição, e hoje em dia é uma equipa de transição que sabe reencontrar-se na posse para os jogos mais áridos da Liga Portuguesa. Evolução na complexidade, futebol dos nossos dias.
A culpa nem sempre é do treinador que a assume – o caso do FC Porto
É inevitável repetir o óbvio, mesmo numa semana em que, dentro de campo, tudo terá corrido mal à equipa do Futebol Clube do Porto. Neste momento, o clube depende muito mais de Sérgio Conceição do que de qualquer elemento da sua administração. A tensão que ao longo das épocas de trabalho de Conceição tem vindo a aumentar prejudica a capacidade de alcançar resultados, mas fragiliza, acima de tudo, aquele que mais tem contribuído para a competitividade dos portistas. O que aconteceu frente ao Club Brugge foi uma visão de erros de pormenor que se podem pagar em faturas altíssimas quando estás na maior prova do mundo. A falta de velocidade e de controlo da profundidade da linha defensiva, a tentação de utilizar jogadores em défice físico, a Taremidependência na forma como a equipa é capaz de manter uma linha consequente na forma de atacar. Sérgio Conceição tem transformado pedras em diamantes, mas os anos de transição tenderão a ser cada vez mais difíceis de gerir, pela maneira como os rivais, dentro e fora, não deixam de aumentar o nível de dificuldade.
No entanto, é a instabilidade diretiva que cria um vulcão emocional que tornará tudo bastante mais complicado de resolver. Uma administração que vive na tensão da sucessão de um líder que definiu a identidade do clube à sua imagem. A complicada teia de compras e vendas que acabou por ficar a nu na forma como algumas das contratações começam a demonstrar que talvez não estejam ao nível dos valores que por elas foram pagas. A inusitada emergência da violência para com a família do treinador, aquele que mais deveria ser protegido no processo de renovação do Porto e que acaba assim atingido da forma mais inaceitável. Na forma de trabalhar da sua equipa técnica, o FC Porto tem o maior valor que poderia encontrar para fazer a transição do seu plantel. Quem faz algo para atacar essa equipa técnica será o principal contribuinte para uma crise onde as consequências serão imprevisíveis.
Fim-de-semana com emoções de volta
Depois de uma semana com tanto o que discutir no futebol português, o meu fim-de-semana foca-se no futebol internacional. A Premier League está de volta e estarei no Aston Villa – Southampton (sexta-feira) e no Brentford – Arsenal (domingo). Quem também regressou à Bundesliga foi o Revierderby, que acontece sábado, entre Borussia Dortmund e Schalke 04 (sábado). Não esquecer, ainda, na programação da Eleven Sports, o Planeta Eleven de domingo à noite com o rescaldo de quentíssimo dérbi de Madrid.